Wednesday, 25 March 2009

A (des)Tradição

de frente para a fruteira lanço um olhar clínico para as tangerinas. observo a côr, o tamanho e o estado da casca. selecciono, com o olhar, as mais laranja, as de tamanho médio e as que têm uma certa rugosidade. depois passo para a interacção com as seleccionadas, tal qual o meu avô me ensinou. pressiono cada tangerina e as mais moles, são eliminadas, as mais rijas, também, restando apenas as que têm a combinação mole/rígida perfeita. depois deste ritual, passado de avô para neta, eu tenho a certeza que a tangerina com o perfeito equilíbrio ácido/doce e suculência é a escolhida. esta minha técnica tem, ao longo dos anos, sido uma mais valia, mas hoje, as tangerinas enganaram-me, pois após o ritual de escolha, ao trincar o primeiro gomo de tangerina, um sumo ácido, tal qual limonada concentrada, libertou-se directamente para a minha língua, arrepiando a minha espinal medula, os cabelos e criando as maiores rugas de expressão que possam imaginar, no fim, trabalhei para a destruição das minhas cordas vocais ao libertar um grunhido vindo de nem sei onde.

eu agora pergunto-me... até com a fruta aplica-se o ditado: quem vê caras não vê corações??

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